domingo, 26 de agosto de 2012


LITURGIA E CATEQUESE

A catequese se estrutura a partir de fontes. Cristo é a fonte por excelência (Revelação), a Sagrada Escritura é a fonte inspirada e documento principal da fé, a Liturgia é a fonte celebrativa do mistério cristão, a Tradição é a rica vivência dos antepassados transmitida para as gerações, o Magistério é a hierarquia constituída que interpreta e atualiza a Palavra de Deus e o Testemunho é a vivência da mensagem evangélica em comunidade, um dos melhores recursos para a catequese . As fontes são lugares e modos nos quais a Palavra de Deus se revela e nos quais a catequese deve beber constantemente para uma identidade sempre genuína .
O DNC destaca que essas duas fontes regam a catequese: Bíblia e Liturgia. A fonte na qual a catequese busca a sua mensagem é a Sagrada Escritura, fruto da experiência de fé de um povo com Deus: nela, a Igreja reconhece o testemunho autêntico da Revelação divina, por isso, é o livro de catequese por excelência e os diversos manuais ou textos catequéticos lhe servem de complementação . Por isso, uma catequese que não assuma a leitura bíblica como característica fundamental, é uma catequese que caminha para a esterilidade, que não alimenta na fé, no diálogo profético, na comunhão e na identidade cristã.
A catequese como educação da fé e a liturgia como celebração da fé são duas funções da única missão evangelizadora da Igreja. A catequese, sem a liturgia, esvazia-se da dimensão do mistério e reduz-se a um amontoado de ensinamentos e teorias sobre Deus e a Igreja, mas sem significado profundo para vida. A liturgia, por outro lado, sem a catequese, é carente do sentido e conteúdo da fé, que se consolida no aprofundamento da mensagem cristã, missão assumida pela catequese .
A liturgia é fonte inesgotável da catequese, não só pela riqueza de seu conteúdo, mas pela sua natureza de síntese e cume da vida cristã: enquanto celebração ela é ao mesmo tempo anúncio e vivência dos mistérios salvíficos; contém, em forma expressiva e unitária, a globalidade da mensagem cristã. Por isso ela é considerada lugar privilegiado de educação da fé e os autênticos itinerários catequéticos são aqueles que incluem em seu processo o momento celebrativo como componente essencial da experiência religiosa cristã .
A liturgia tem um enorme potencial evangelizador e catequético, ou antes, que ela própria é, sem perder a sua especificidade, uma forma excelente de evangelização e de catequese. Mas não de forma automática e quase mágica: para se tornar catequese em ação, a liturgia tem de percorrer um longo caminho de renovação, de avaliação de suas linguagens simbólicas, de inculturação, seguindo as leis de toda comunicação da fé válida e correta .
A ação litúrgica faz memória, isto é, torna presente, traz para o momento atual os acontecimentos da salvação. A liturgia é a celebração dos mistérios de Deus. Os “mistérios” são os projetos de Deus que se realizam na pessoa de Jesus Cristo: a redenção e a salvação de todos os homens, a instauração do Reino. O mistério central da vida de Cristo é o mistério pascal. A liturgia celebra a páscoa do Senhor e a páscoa de seu povo. Celebra os sofrimentos, a morte, e a vitória de Cristo sobre a morte, mas celebra também os sofrimentos, as dores, derrotas, e vitórias do povo, a esperança da concretização do Reino na vida humana .
A liturgia, com seu conjunto de sinais, palavras, ritos, símbolos, em seus diversos significados, requer da catequese uma iniciação gradativa e perseverante para ser compreendida e vivenciada. Os sinais litúrgicos são ao mesmo tempo anúncio, lembrança, promessa, pedido e realização, mas só por meio da palavra evangelizadora e catequética esses seus significados tornam-se claros. É tarefa fundamental da catequese iniciar eficazmente os catequizandos nos sinais litúrgicos e através deles introduzi-los no mistério pascal .
Aquilo que não é celebrado não pode ser apreendido em sua profundidade e em seu significado para a vida. A catequese leva em conta essa expressão de fé pelo rito para desenvolver também uma verdadeira educação para a ritualidade e o simbolismo. Há, portanto, uma sintonia entre a fé, a celebração e a vida. O mistério de Cristo anunciado na catequese, isto é, o saber catequético, é assimilado e saboreado, através da ritualidade, do simbolismo, do ritmo que a liturgia imprime, pelo seu caráter mistagógico. Portanto, o saber, é capaz de oferecer os elementos necessários para a compreensão daquilo que é celebrado e dar-lhe sentido e significado .
A catequese tem uma tarefa de iniciação na vida litúrgica em três dimensões principais: no plano da celebração, a catequese inicia nos diversos ritos e formas de expressão; no plano do mistério, a catequese favorece e ilustra experiências bíblicas e eclesiais significadas pelos ritos; no plano da existência, a catequese deve educar na acolhida, no agradecimento, na comunhão, na escuta .
O processo da formação litúrgica na catequese possui diversos elementos, importantes para a compreensão intrínseca ligação entre ambas: centralidade do Mistério Pascal de Cristo na vida dos cristãos e em todas as celebrações; a compreensão dos ritos e símbolos como reveladores da ação pascal de Cristo e experiências de encontro com o Ressuscitado; a dimensão comunitária da liturgia com sua variedade de ministérios; o exercício de preparar boas celebrações, realizá-las adequadamente e proclamar claramente a Palavra; a participação dos cristãos na Eucaristia; a espiritualidade pascal, ao longo do Ano Litúrgico; a espiritualidade penitencial ou de conversão mediante a celebração do Sacramento da Conversão e Reconciliação; o sentido dos sacramentos, especialmente a Eucaristia, como sinais da comunhão com Deus, em Cristo, que marcam, com sua graça, momentos fortes da vida e atualizam a salvação no nosso dia a dia; aprofundamento do sentido da presença de Maria no mistério de Cristo e da Igreja; redimensionamento bíblico-litúrgico da religiosidade popular .
Há de se cuidar para que não haja somente preocupação com a transmissão de conteúdo na catequese, mas também se enfatize a dimensão celebrativo-litúrgica que corresponde ao saborear. A liturgia tem mais a ver com sabor, com a experiência de sentir o toque de Deus na realidade humana, por isso, quanto menos explicações e comentários, mais o canal de comunicação por meio da linguagem simbólica, ritual, sonora, gestual será eficaz. É a experiência do mergulho da inteireza do ser no mistério celebrado.
Para tanto, é importante que a catequese tenha na celebração o ponto alto do encontro, momento em que há interiorização, partilha e crescimento da fé a partir da vida. A catequese litúrgico-celebrativa é carregada de momentos fortes de oração (súplica, gratidão, intercessão e perdão), faz o confronto pessoal e comunitário com a realidade, da fé com a vida e da vida com a fé.  A catequese com celebrações vivenciais favorece uma compreensão e uma experiência sempre rica da liturgia, conduz para uma leitura dos gestos e sinais, e educa a participação ativa nas celebrações dos sacramentos, para a contemplação e para o silêncio.
A catequese com expressões celebrativas exige atenção para alguns detalhes: atenção ao corpo como fonte de sentimento, emoção, experiência, alegria, lágrimas, afeto, carinho, acolhida; a linguagem simbólica, sempre aberta ás diversas interpretações, por isso jamais explicada; expressões, cores, posições, gestos, caminhadas, músicas rituais, danças, olhares: tudo como forma de comunicar o mistério e envolver o ser religioso no encontro com o Sublime.


Roberto Bocalete, especialista em Pedagogia Catequética PUC-GOIÁS

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